NO JORNAL DE FATO!UM TEXTO ESPETACULAR DE ÂNGELA RODRIGUES .

ESTOU ALEGRE, TRISTE, SAUDOSA…

Ângela Rodrigues Gurgel

Autora de Ensaio Poético e Confissões Crônicas, idealizadora da confraria Café & Poesia.

[email protected]

Se me perguntarem como estou, direi que estou estranha. Mas não sei explicar o que isso significa. Se disser que estou feliz, não estarei mentindo. Mas se disser que estou triste, também estarei sendo honesta. Se confessar que estou com saudade, continuarei sendo fiel ao que sinto. Estou confusa?!… Não, talvez reflexiva. Será culpa do eclipse? Afinal, como nos ensinou o mestre Raul em suas Profecias: “Os selos de fogo, o eclipse / Os símbolos do apocalipse / Os séculos de Nostradamus / A fuga geral dos ciganos / Está em qualquer profecia / Que o mundo se acaba um dia”. Não, eu não estou preocupada com o fim do mundo, mas torço pelo fim da guerra… aliás, das muitas guerras. As bélicas, as ideológicas e todas as outras que tiram vidas e matam sonhos.

Voltando ao “meu estado”, posso dizer que estou feliz porque, ao longo da vida, tenho realizado muitas coisas que nunca me imaginei que conseguiria fazer. Descobri que posso fazer mais do que pensei ou ousei sonhar. Sim, muitas vezes faço coisas sem saber por que estou fazendo para depois descobrir, maravilhada, que fiz o que deveria ter sido feito. O que me levou a fazê-las? Intuição? Percepção? Experiência? Conhecimento? Não sei! Só sei que as coisas vão acontecendo e me levando com elas, quando percebo já estou inserida em situações que não planejei, mas que, de algum modo, foram necessárias e importantes para o momento.

Estou triste porque a tristeza faz parte do pacote. É algo que acompanha qualquer um que tenha um mínimo de empatia. Não há como ficar indiferente à crescente onda de violência que alarga as desigualdades, os preconceitos, a exclusão, a fome, as doenças, as injustiças, a guerra. Diante desse quadro sinto-me impotente, pequena – triste.

Estou com saudades do que era para ter sido (?) e não foi. Saudade dos sonhos que sonhei e que se perderam na concretude do real. Sonhos que, por mais que eu possa realizar milhões de outros, nunca poderão ser substituídos. Saudades de mim, mas não tenho saudade de algumas coisas que alteraram meu viver. Um parêntese, quando digo que estou com saudade, é apenas isto o que estou dizendo. Não estou reclamando de volta a vida que tive, a pessoa que fui. Estou muito bem com a pessoa que me tornei e com a vida que tenho hoje! Sei que tudo isso pode parecer estranho, confuso. Que pareço dizer o contrário do que estou sentindo. Que posso estar confundindo quem teve a (in)feliz ideia de ler este texto, mas quem nunca se sentiu dentro da Roda Viva, de Chico Buarque? Quem nunca amanheceu “Como quem partiu ou morreu/ (…) estancou de repente (…) A gente quer ter voz ativa / No nosso destino mandar / Mas eis que chega a roda-viva / E carrega o destino pra lá. Roda mundo, roda-gigante / Rodamoinho, roda pião / O tempo rodou num instante / Nas voltas do meu coração…”

A verdade (?) é que às vezes me sinto uma completa estranha, única espécie a habitar um planeta desconhecido. Uma sensação de estar no lugar e na época errada. Claro que é apenas um pensamento tolo, mas quem consegue calar os pensamentos!?… Tenho plena consciência que sou uma minúscula partícula desse imenso universo. Fio desse imenso tecido social, cerzido por muitas mentes e milhares de mãos sonhadoras, pragmáticas, inventivas, práticas – humanas.

Mas isso não altera minha condição de pessoa feliz, triste e com saudade… talvez eu seja apenas alguém em busca de respostas geradoras de novas perguntas. Sim, é verdade, as perguntas não param de brotar, as inquietações são inúmeras, os sentimentos estão misturados dentro de mim, sem conflitos, mas, também, sem previsão de acordo a curto ou longo prazo. A verdade é que, como disse Valesca Mayssa, em Dias de Guerra: “Tem dias que o dia acorda estranho e / A angústia bate e não tem tamanho / Dá vontade de chorar (…) Mas eu bem sei, a matéria-prima que eu te formei / Já sabia que teria dias, que isso tudo ia pesar / E a pressão ia aumentar…”. Talvez seja apenas isso.

Mas, há sempre um mas, ainda bem que existe a fé, a poesia, a família, os amigos e o café para nutrir os sonhos e tecer toques de beleza e encantamento aos nossos dias. Afinal, apesar dos dias estranhos, viver é uma arte. Um exercício que deve ser (re)feito, diariamente, com leveza, gentileza e harmonia.